O que fazemos com as coisas que lemos no jornal?
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“Nunca lhe aconteceu, ao ler um livro, interromper com freqüência a leitura, não por desinteresse, mas, ao contrário, por afluxo de idéias, excitações, associações? Numa palavra, nunca lhe aconteceu ler levantando a cabeça?” Essa é uma frase do livro Rumor da língua, escrito em 1988, por um autor francês chamado Roland Barthes. Poderíamos entendê-la de inúmeras formas, mas me agrada pensar que se trata da capacidade que todo texto tem de acordar em nós, leitores, outros textos, aqueles que vamos guardando vida à fora no imenso reservatório da memória.
Como quem monta um quebra-cabeças, vamos juntando todas as peças disponíveis: as que já tínhamos e as novas, encaixando umas nas outras e formando uma imagem, ou seja, a nossa interpretação sobre aquele texto. Por isso dizemos que todo leitor é co-autor do texto que lê, porque é ele quem constrói o significado do que está lendo a partir da sua bagagem cultural, e que ao acessar um texto, qualquer um, encontra a si próprio refletido nas águas da leitura.
Nós somos o que somos à media que vamos lendo e escrevendo o mundo ao nosso redor, não apenas com as letras, mas com os sons, com as fotografias e com as imagens em movimento produzidas e espalhadas por aí. Então, um filme ou um livro guarda em si dois segredos: a história da sociedade na qual ele foi escrito e a história de cada leitor que abre suas páginas, pois junto com elas abre também todas as suas leituras anteriores, as suas crenças, os seus valores e a suas experiências de vida.
Alguma razão para os textos jornalísticos serem exceção a essa dinâmica?
Ao investigar O Nacional descobri, reveladas pelas tramas da narrativa jornalística de dois séculos, que as possibilidades de leitura em certas ocasiões transcendem essa instância da objetividade jornalística estabelecendo um vínculo ainda mais estreito entre o leitor e o texto. Através da leitura, reconhecemos o outro, nos reconhecemos, questionamos o lugar, o compromisso do sujeito com o mundo e ressignificamos a história como produto contingente. Ou seja, as imagens, as notícias publicadas nas páginas do jornal, nos dizem de diferentes formas, que somos responsáveis por esta história que está sendo escrita, que fazemos parte dela.
Descobri que cada notícia pode guardar em si uma surpresa, exigindo que nos questionemos sobre quem somos, sobre nossa identidade: o que nos aproxima ou nos distingue do outro, personagem do texto e, afinal, qual é a nossa contribuição para transformar essa realidade noticiada?
Olhando para O Nacional, um veículo de circulação local, percebi a evidência de um dado universal sobre o jornalismo e sobre nosso papel como leitores. E para mim aqui está o grande valor deste jornal.
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